sábado, 2 de junho de 2012

Capitalismo e socialismo no contexto brasileiro

Ao ler o artigo Rockefeller sobre o capitalismo, que o Diego escreveu, não pude deixar de traçar os paralelos desses dois sistemas. Vou começar por defini-los:

O Capitalismo é definido como um sistema econômico baseado na propriedade privada dos meios de produção, na detenção do capital a uma minoria burguesa, na exploração do opressor sobre o oprimido, esse último representado pelos trabalhadores.

O Socialismo é um sistema político onde todos os meios de produção e a centralização do poder pertencem ao estado, onde não existe a propriedade privada, ao contrário do capitalismo.

A pergunta é: Qual a analogia que podemos fazer em dois modelos econômicos tão diferentes?

Primeiro, temos que os dois modelos, à sua maneira concentram o capital e o poder: No capitalismo, em poder de poucos, e no socialismo em poder do Estado, sendo que nesse sistema, a concentração é um processo de transição.
Analisemos o Brasil. Como em qualquer outro país, tem a sua identidade nacional, que nada mais é que uma construção histórica e política em torno da idéia de nação e nacionalidade – como o nome já sugere, bem como características consideradas comuns e enraizadas em determinada cultura, como já fazendo “parte de nós”.

No Brasil coisas como corrupção, hipocrisia, submissão, discriminação social e racial, cinismo, exploração, violência, miséria, já fazem parte de nossa identidade nacional. Como por exemplo, ver um mendigo dormindo na rua ao relento, uma criança pedindo dinheiro no farol ou um escândalo de corrupção por parte dos políticos se tornaram corriqueiras, banais e não nos causa estranheza.

Concluindo, qualquer que seja o modelo econômico, o brasileiro não deixará de tentar tirar vantagem quando lhe for conveniente. Ou não deixará de passar por cima de um mendigo dormindo na rua, ou até mesmo, discriminar as pessoas pela cor de sua pele. E de quem é a culpa? Das pessoas? Do modelo econômico?

Claro que ninguém assume a culpa, eximindo-se de qualquer responsabilidade pelo padrão moral, social e ético vigente.

O Estado como em qualquer sociedade organizada tem seu papel certamente importante, pois é ele que estrutura o sistema, investe em infra-estrutura. Ele é o responsável pela organização e distribuição do dinheiro arrecadado fruto dos nossos impostos. Teoricamente esse discurso seria muito bonito, mas sabemos que na prática não funciona. Vivemos em um sistema capitalista onde o trabalhador é uma máquina, um produto, facilmente substituível e descartável.

Um problema muito marcante no Brasil – consequência do capitalismo – é a grande concentração de renda. Mas por outro lado o capitalismo favorece a corrida pelo capital e a chance de fazer parte da classe social favorecida, a burguesia, é uma grande vantagem para quem tem tendencias individualistas. Coisa que não aconteceria no socialismo, pelo ideal igualitário, onde teríamos justiça social. E nenhum ser humano ou classe social estaria acima de outro.
O fato é que fazemos parte de um sistema estruturado, um modelo feito para nós, que ao invés de políticas de encontro ao interesse do povo, de uma atuação direta modificadora, igualitária e justa, temos políticas assistencialistas, que só fazem aumentar a pobreza e a desigualdade social.

Como formar uma sociedade justa e igualitária?

Implantando o socialismo? Bom, seria uma ótima opção, mas no contexto atual, não seria possível, sem antes uma coscientização de massa, e um intenso trabalho de base.

Seja qual for o sistema econômico, o problema é que ele é gerido por pessoas, com seus próprios interesses e ideais, seja pessoal ou coletivo. E todo modelo econômico assume seu poder e seu controle. Tendo os que concordam e os que discordam, por tanto, passível de crítica e divergências, mas o fato é que lidam com pessoas, embora tratando como números ou produtos.

A solução, no contexto atual, uma mudança real, começa numa atuação das pessoas como estado, uma atuação direta ou indireta: na reinvindicação dos próprios direitos, na solidariedade e acima de tudo na compreensão das questões políticas e sociais, pois um fato verdadeiro e brasileiro é que existe uma parcela muito significativa da população que são alheios a política. Os chamados analfabetos políticos, como diria Bertold Brecht:

O pior analfabeto, é o analfabeto político.

Acredito que quando as pessoas perceberem sua força e seu papel modificador, seja na sua própria vida, no trabalho, em sua casa, e quando essas mesmas pessoas forem mais solidárias, a revolução tão sonhada e esperada pelos socialistas pode vir a acontecer. Ou uma revolução socialista ou uma revolução social, de livre mercado, com melhor distribuição de renda, dando oportunidade para todos. Se não for o socialismo, talvez um novo modelo econômico, uma espécie de união do capitalismo com o socialismo, um completando o outro. Esse seria um mundo ideal, um modelo econômico igualitário e justo.

Suzi Alves.

Nem capitalismo, nem socialismo, nem morte

Marcelo Spalding


Quando Hugo Chávez jurou, em alto e bom som, no dia 10 de janeiro de 2007, “Pátria, socialismo ou morte”, o mercado tremeu. Alguns governos riram. O mundo refletiu.
Chávez é hoje o genuíno representante da corrente de pensamento que mais abalou o capitalismo moderno, herdeiro próximo de Fidel Castro, seguidor de Marx e dos russos da Revolução de Outubro. Isolado num pequeno país, respaldado pelas urnas e financiado pelo petróleo que jorra das terras venezuelanas, já anunciou para esse terceiro mandato a nacionalização de empresas como a CANTV – maior telefônica do país –, sua filial de telefonia celular e a Companhia Elétrica de Caracas, todas controladas por empresas estrangeiras, além de ameaçar a maior cadeia de televisão do país, a RCTV, de não renovar sua concessão. Contrárias às leis e convenções de mercado em voga há mais de século, as medidas de Chávez não são inéditas mas parecem anacrônicas depois da queda do Muro de Berlim e do chamado “fim do socialismo”.
Ocorre que Hugo Chávez é propositivo. Como comandante de um Estado, ele não apenas critica nos discursos e tenta amenizar nas políticas o efeito do capitalismo dominante – como fazem muitos sociais democratas latino-americanos –, Chavéz parece realmente acreditar na receita marxista e leninista para seu país, e por isso soa tão anacrônico. Com mandato até 2013, é possível que consiga aplicar muito dessa receita e é com atenção que acompanharemos suas tentativas. Mas não se pode ver a experiência da Venezuela como uma atitude isolada, e sim como sinal da permanência do pensamento marxista, que não sucumbiu sob os escombros do Muro de Berlim e ecoa hoje nas academias, nos parlamentos e na cultura.
É no âmbito cultural, aliás, mais do que no político, que a resistência de aderir completamente ao capitalismo financeiro contemporâneo é maior, e vozes destoantes do pensamento único seguem fazendo música, literatura, artes, intervenções e mesmo cinema, sem a fúria, o medo e a paixão dos tempos negros da Guerra Fria, mas com as mesmas inquietações. No lirismo de um Hatoum em Cinzas do Norte ou na denúncia social de um Freire em Contos Negreiros, na contundência de um Pepetela ou nas alegorias de um Saramago perpassa a preocupação social e a denúncia das desigualdades abissais que nosso sistema não apenas permite como promove há anos e anos. Mas mesmo as obras literárias de hoje são mais reflexivas do que propositivas – não há hoje espaço para um Jorge Amado pregando a revolução socialista, por exemplo –, primeiro porque as decepções são muitas e as verdades, raras, depois porque a cultura está submetida a um mercado e ele tem, sim, sua lógica e suas regras.
Uma das exceções no mercado cultural é a Editora Expressão Popular. Voz destoante em meio a grandes editoras comerciais, desde 1999 publica o que eles chamam de “livros bons, de boa qualidade e a preços acessíveis, com o compromisso de construir um novo mundo e a certeza de que essa possibilidade será tanto maior quanto maior for o acesso dos homens e mulheres, sujeitos e protagonistas dessa construção, aos saberes desenvolvidos nesse rumo”.
Demonstrando vitalidade, a editora já tem mais de 100 títulos que vão de literatura a ensaios biográficos divididos em coleções chamadas de “Imperialismo”, “Assim lutam os povos”, “Trabalho e Emancipação” e “Revoltas Militares”, por exemplo. No começo de 2007, lançou diversas obras, como Da guerrilha ao socialismo – a Revolução Cubana, de Florestan Fernandes, O Estado e a revolução, de Vladmir Lenin, O trabalho no espaço da fábrica – um estudo da General Motors em São José dos Campos (SP) , de Gilberto Cunha Franca, e Privatização da CSN – da luta de classes à parceria, de Edílson Graciolli.
Em Da guerrilha ao socialismo, obra do final dos anos 70, Florestan Fernandes elabora um minucioso – e entusiasmado – quadro teórico da experiência cubana, desde suas origens históricas até as experiências de implantação do poder popular. No prefácio, Antônio Cândido afirma que a leitura é tensa mas compensadora, pois o leitor sai dela com um conhecimento privilegiado da Revolução Cubana. Agora imagine o quanto seria enriquecedor para nós, leitores pós-89 que estamos assistindo aos últimos anos de Fidel Castro e à transformação da China comunista em potência capitalista.
É também de Florestan Fernandes a apresentação de O Estado e a revolução, de Lenin, obra publicada em agosto de 1917, pouco antes da Revolução de Outubro que marcaria a história mundial no século XX. O livro procura demonstrar, a partir de denso estudo das obras de Marx e Engels, como o Estado é um instrumento de exploração da classe oprimida, incitando os trabalhadores a tomar o poder do Estado para, numa fase posterior, destruí-lo, ainda que para tanto seja necessária repressão: “a substituição do Estado burguês pelo Estado proletário não é possível sem uma revolução violenta”, escreve Lenin.
Lenin, mais do que um documento de inestimável valor histórico pela proximidade da revolução que lideraria, faz uma interpretação valiosa da obra de Marx, uma interpretação mais belicosa do que os marxistas europeus do século XX costumavam fazer que em certos trechos chega a assustar um leitor do século XXI, leitor que mesmo consciente da desigualdade social do mundo contemporâneo já cansou de guerras, revoluções e mortes.
“Quem só reconhece a luta de classes não é ainda marxista e pode muito bem não sair dos quadros do pensamento burguês e da política burguesa. Limitar o marxismo à luta de classes é truncá-lo, reduzi-lo ao que é aceitável para a burguesia. Só é marxista aquele que estende o reconhecimento da luta de classes ao reconhecimento da ditadura do proletariado. A diferença mais profunda entre o marxista e o pequeno (ou grande) burguês ordinário está aí.”
Adiante, vai além ao justificar a necessidade da revolução:
“Uma revolução é, certamente, a coisa mais autoritária que há, um ato pelo qual uma parte da população impõe a sua vontade à outra, com auxílio dos fuzis, das baionetas e dos canhões, meios por excelência autoritários; e o partido que triunfou tem de manter a sua autoridade pelo temor que as suas armas inspiram aos reacionários. Se a Comuna de Paris não se tivesse utilizado, contra a burguesia, da autoridade do povo em armas, teria ela podido viver mais de um dia?”
À época a Rússia estava arrasada pelos efeitos não apenas da economia como da Primeira Grande Guerra e as promessas do comunismo eram uma saída, talvez a única, talvez a última. De fato, para aquela geração, parecia ser socialismo ou morte. Mas hoje, quase cem anos depois das palavras contundentes e emocionadas de Lenin, depois de assistirmos aos abusos ditatoriais do governo bolchevique e da impossibilidade de atingir o passo supremo do socialismo – o comunismo – é no mínimo perigoso não dar outra alternativa a uma pátria se não “socialismo ou morte”, como fez Hugo Chávez. Mas tão perigoso quanto é renegar as mazelas que a sociedade capitalista aprofunda e produz sob pena de sucumbirmos diante da criminalidade, da crise ambiental, da falta de expectativas. Ao invés de pegarmos em armas ou participarmos de forma hedonista do oba-oba capitalista, parece que chegou a hora de procurarmos alternativas, palavras que produzam melhor frase do que a pronunciada por Chávez. Nem capitalismo, nem socialismo, nem morte.

O “Sucesso” dos Países Comunistas nos Esportes

Sucesso e comunismo são palavras que normalmente não andam juntas. Por isso, não deixa de causar curiosidade a recorrente afirmativa de que os países comunistas tiveram sucesso em promover os esportes. É comum ouvir professores elogiando Cuba, por exemplo, como uma potência esportiva. Vamos a uma breve análise referente a mais este MITO comunista.
Numa economia de mercado, um indivíduo tem várias oportunidades referentes ao futuro de sua vida. Pode escolher dentro de um rol muito grande de opções qual é a mais adequada a seu perfil. Nesse processo de escolha, o indivíduo leva em conta que, normalmente, a vida profissional de um atleta começa após os 17 anos, e termina antes dos 37 anos. Assim, para a grande maioria dos atletas, são no máximo 20 anos de profissão. Período esse extremamente curto quando comparado à outras profissões. Após essa breve carreira, o atleta tem que escolher outra profissão e começar praticamente do zero. Dessa maneira, só existem dois tipos de indivíduos que aceitam seguir uma carreira esportiva: a) os atletas realmente fantásticos, aqueles que não só são fenomenais no esporte como também possuem habilidade suficiente para, durante um breve período de tempo, acumular recursos para o restante de sua vida; e b) os não tão fenomenais, mas que também não são habilidosos em outras profissões, escolhendo assim o mundo dos esportes. Como não existem tantos atletas geniais, é comum que, numa economia de mercado, grandes talentos esportivos escolham outras profissões. Com isso podemos inferir que o sucesso de medalhas olímpicas, de países como os Estados Unidos e Inglaterra, devem-se sobretudo à capacidade do capitalismo em gerar condições para atletas medianos, mas que não têm grandes habilidades fora dos esportes, tornarem-se grandes campeões.
Numa economia socialista temos uma drástica mudança: o custo de se entrar no mercado de trabalho aos 37 anos não é tão alto. Afinal, economias socialistas pregam um alto grau de igualdade salarial. Assim, um atleta que abandona os esportes em idade avançada pode ingressar no mercado de trabalho, ganhando um salário próximo ao de outros funcionários que possuem anos a mais de experiência. Mais do que isso, em regimes socialistas, medalhistas olímpicos são transformados em heróis nacionais, pois o esporte é usado como arma política. Além disso, ser um atleta de nível internacional é uma das poucas maneiras de se escapar do “paraíso” socialista. Dessa maneira, ser atleta numa economia socialista é uma profissão com altos retornos. Não por méritos do regime socialista, mas antes pelos deméritos desse sistema. O alto número de medalhas olímpicas obtidas pelos países socialistas não se devem à sua capacidade em promover o esporte, mas sim pela INCAPACIDADE desse regime em gerar outras opções ao indivíduo.
Após essa breve análise, podemos inferir que o “sucesso”comunista no mundo dos esportes não passa de mais uma fraude publicitária. Pois tal “sucesso” não provém dos méritos desse sistema, mas é sim um sub-produto de seus deméritos.

A crise do feudalismo

A crise do feudalismo é um processo de longa duração que conta com uma série de fatores determinantes. Entre outros pontos, podemos destacar que a mudança nas relações econômicas foi de grande importância para que as práticas e regras que regulavam o interior dos feudos sofressem significativas transformações. Essa nova configuração econômica, pouco a pouco, influiu na transformação nos laços sociais e nas idéias que sustentavam aquele tipo de ordenação presente em toda a Europa.
O caráter auto-sustentável dos feudos perdeu espaço para uma economia mais integrada às trocas comerciais. Ao mesmo tempo, a ampliação do consumo de gêneros manufaturados e especiarias, e a crise agrícola dos feudos trouxeram o fim do equilíbrio no acordo estabelecido entre servos e senhores feudais. Essa fase de instabilidade envolvendo as relações servis trouxe à tona um duplo movimento de reorganização dos feudos.
Por um lado, as relações feudais em algumas regiões sofrerem um processo de relaxamento que dava fim a toda rigidez constituída na organização do trabalho. Os senhores de terra, cada vez mais interessados em consumir produtos manufaturados e adquirir especiarias, passavam a estreitar relações com a dinâmica econômica urbana e comercial. Para tanto, acabavam por dar mais espaço para o trabalho assalariado ou o arrendamento de terras em troca de dinheiro.
Entretanto, não podemos dizer que a integração e a monetarização da economia faziam parte de um mesmo fenômeno absoluto. Em algumas regiões, principalmente da Europa Oriental, o crescimento demográfico e a perda da força de trabalho para a economia comercial incentivaram o endurecimento das relações servis. Imbuídos de seu poder político, muitos senhores de terra da Rússia e de partes do Sacro Império Germânico passariam a exigir mais obrigações e impostos da população campesina.
De forma geral, esse processo marcou um período de ascensão da economia européia entre os séculos XII e XIII. No entanto, o século seguinte seria marcado por uma profunda crise que traria grande reformulação (ou crise) ao mundo feudal. Entre 1346 e 1353, uma grande epidemia de peste bubônica (peste negra) liquidou aproximadamente um terço da população européia. Com isso, a disponibilidade de servos diminuiu e os salários dos trabalhadores elevaram-se significativamente.
Esse processo fez com que as obrigações servis fossem cada vez mais rígidas, tendo em vista a escassez de trabalhadores. Os grandes proprietários de terra acabaram criando leis que dificultavam a saída dos servos de seus domínios ou permitia a captura daqueles que fugissem das terras. A opressão dos senhores acabou incitando uma série de revoltas camponesas em diferentes pontos da Europa. Essas diversas rebeliões ficaram conhecidas como “jacqueries”.
No século XV, o declínio populacional foi superado reavivando a produção agrícola e as atividades comerciais. Essa fase de recuperação ainda não foi capaz de resolver as transformações ocorridas naquela época. A baixa produtividade dos feudos não era capaz de atender a demanda alimentar dos novos centros urbanos em expansão que, ao mesmo tempo, tinham seu mercado consumidor limitado pela grande população rural.
Além disso, o comércio sofria grandes dificuldades por conta dos monopólios que dificultavam e encareciam a circulação de mercadorias pela Europa. Os árabes e os comerciantes da Península Itálica eram os principais responsáveis por esse encarecimento das especiarias vindas do Oriente. A falta de moedas, ocorrida por conta da escassez de metais preciosos e o escoamento das mesmas para os orientais, impedia o desenvolvimento das atividades comerciais.
Tantos empecilhos gerados à economia do século XV só foram superados com a exploração de novos mercados que pudessem oferecer metais, alimentos e produtos. Esses mercados só foram estabelecidos com o processo de expansão marítima, que deflagrou a colonização de regiões da África e da América. Dessa forma, a economia mercantilista dava um passo decisivo para que um grande acúmulo de capitais se estabelecesse no contexto econômico europeu.

Por Rainer Sousa
Mestre em História

Por Rainer Gonçalves Sousa

Entenda um conceito fundamental da teoria marxista

da Folha Online

A mais-valia é um dos conceitos mais importantes do pensamento marxista. Por meio dele podemos compreender a exploração capitalista e a própria história do século 20.

Reprodução

Livro explica a obra de Marx, seus principais conceitos e suas "profecias"

Livro explica a obra, os principais conceitos e suas "profecias"

"Marx", parte da coleção "Folha Explica", apresenta um estudo atualizado e sintético das principais ideias do filósofo alemão. Conceitos como alienação, mercadoria, capital, dialética do capitalismo, fetichismo, ideologia, crise e revolução são observados de maneira crítica e didática.

Saiba mais e leia introdução do livro.
Entenda a crise econômica pela ótica de Karl Marx

O autor do livro, Jorge Grespan, professor de Teoria da História da USP, classifica a obra de Marx como "profética".

Entre as "profecias" de Marx, comentadas no livro, estão a irradiação da forma de mercadoria a quase todos os produtos e relações sociais, o surgimento dos conglomerados financeiros e industriais e a crescente substituição de mão-de-obra por máquinas cada vez mais sofisticadas.

"O poder de previsão de Marx foi tão grande que o mundo em que vivemos acabou se tornando demasiado semelhante ao das tendências descritas por sua obra", conclui o autor. Abaixo, leia um trecho do livro.

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O CAPITALISMO

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De início, é como circulação de mercadorias que aparece a relação entre força de trabalho - mercadoria vendida pelo trabalhador - e capital - o dinheiro com que o capitalista compra essa mercadoria, isto é, com que paga o salário. Nessa esfera de circulação, o dinheiro do salário é equivalente ao valor da força de trabalho, como ao de qualquer outra mercadoria. Aqui reina a equivalência das trocas, a igualdade entre capitalistas e trabalhadores, a isonomia jurídica entre as partes que celebram contrato, vista no capítulo anterior.

A desigualdade social entre eles aparecerá na realidade do contrato, isto é, quando o trabalhador trabalhar para o capitalista, Ele o fará utilizando matéria-prima e instrumentos que são de propriedade do capitalista, de modo que também a este último caberá a propriedade do produto. Em troca do seu trabalho, o trabalhador receberá do excedente de valor, a mais-valia, que explica a lógica do capitalismo.

Pois o Valor que a força de trabalho deve receber para repor seu dispêndio de energia física e mental, para poder continuar trabalhando e criar filhos que trabalharão no futuro - esse valor, que se realiza no salário, é totalmente distinto do valor do produto que o trabalhador produz para o capitalista vender. A força de trabalho e o seu produto são coisas independentes uma da outra, de modo que seu valor também o é. Se o valor do produto for maior que o da força de trabalho, a diferença dos dois representará um ganho para o capitalista, o "mais-valor" ou "mais-valia". Se for menor, haverá perda, e não valerá a pena para o capitalista contratar mão-de-obra e produzir.

Como o valor se calcula em tempo, tomando uma jornada de trabalho é fácil verificar que num certo momento, depois de algumas horas, os trabalhadores produziram uma quantidade de produto que, se vendido pelo capitalista, permitiria a ele já pagar os salários. É o que Marx chama de "trabalho pago". Só que os trabalhadores trabalham para o capital e não para si mesmos. No contrato proposto pelo capitalista, eles devem trabalhar por uma jornada mais longa do que aquela suficiente para criar o equivalente aos seus salários. O valor que eles produzem nesta segunda etapa é o que corresponde à mais-valia ou ao "trabalho não pago". Em princípio, de qualquer maneira, trata-se de dois valores distintos.

Ou seja, a mais-valia não surge necessariamente da sub-remuneração da força de trabalho. Nas palavras de Marx, "a circunstância de que a manutenção diária da força de trabalho só custa meia jornada de trabalho, apesar de a força de trabalho poder operar, trabalhar um dia inteiro [...] é grande sorte para i comprador, mas, de modo algum, uma injustiça com o vendedor". 1

1 Marx, K, O Capital Volume 1, Tomo 1

Crise afetará neoliberalismo

quinta-feira, 2 de outubro de 2008, 07:33 | Online

Crise afetará neoliberalismo, dizem analistas

Intervenção dos EUA na economia mostra que ação do Estado é importante para o funcionamento do sistema

Giuliana Vallone, do estadao.com.br

SÃO PAULO - A conseqüência da intervenção do governo norte-americano na economia do país para os fundamentos do neoliberalismo econômico, segundo os quais o mercado financeiro deve se auto-regular e a intervenção do Estado na economia é mínima, divide a opinião de economistas e políticos do País. Enquanto alguns, como o senador Aloizio Mercadante (PT), defendem que a teoria de auto-regulação naufragou com a atual crise financeira, outros, como o economista Luiz Carlos Mendonça de Barros, ex-presidente do BNDES, afirmam que os problemas no mercado de crédito mostram apenas que o liberalismo econômico tem limites, e que a participação dos governos ainda é um instrumento importante no funcionamento do sistema mundial. O ponto comum na avaliação deles, porém, é que as teorias adotadas hoje não passarão ilesas pela crise.

"O que precisamos é um entendimento correto sobre os limites do liberalismo", afirmou Mendonça de Barros. Para ele, o que está derrotada é uma visão errada do equilíbrio entre a ação de governos e a liberdade dos mercados. "A frase cunhada pelo ex-presidente Reagan - o governo é o problema e não a solução - é que precisa ser enterrada definitivamente", explicou.

Segundo Barros, a teoria econômica não precisa ser mudada, já que a crise "foi motivada integralmente por um delírio especulativo com produtos financeiros". O que seria necessário é buscar um equilíbrio entre restrições legais e auto-regulação, especialmente nos mercados organizados como bolsa de valores e de derivativos financeiros. Ele ressalta, porém, que as regras estabelecidas precisam evoluir com os novos produtos financeiros, para evitar o surgimento de espaços não regulados.

O senador Aloizio Mercadante, por outro lado, acredita que as mudanças são mais profundas que isso. Para ele, "a visão que o Consenso de Washington (conjunto de medidas que previa uma maior liberalização da economia da América Latina, formulado em 1989 por economistas de instituições como FMI, Banco Mundial e Departamento do Tesouro dos EUA) apresentou como pensamento único naufragou nessa crise". "Isso mostra que o pensamento de (John Maynard) Keynes, o papel do Estado como regulador da atividade seguramente terá que retornar", concluiu.

As teorias de Keynes, formuladas em meio à Grande Depressão de 1929, previam o equilíbrio entre o livre comércio e um generoso sistema de proteção do mercado financeiro. Para Mercadante, não haverá estabilidade financeira sem novos mecanismos de controle e regulação do sistema financeiro. Além disso, ele afirma que essa intervenção será exigida pelo povo norte-americano. "Os contribuintes americanos jamais vão aceitar essa socialização das perdas (das instituições financeiras) sem a segurança de que situações como essa não se repetirão com essa gravidade", explicou.

"E as crises sempre ajudam na formulação de teorias econômicas, tanto no sentido da prevenção em relação a crises futuras, quanto de alternativas para superar os impasses que elas patrocinam. Então nós teremos um avanço da teoria", continuou.

Debate

Para o ex-secretário de política econômica do Ministério da Fazenda, Luiz Gonzaga Belluzzo, os problemas no crédito demonstram que mercados mal regulados podem apresentar o tipo de comportamento que culmina numa crise financeira. "Certamente essa intervenção (do governo dos EUA) se fez contrariando muitas previsões e opiniões a respeito da forma como os mercados funcionariam, se ajustariam", disse.

Ele afirmou que a turbulência vista nas últimas semanas colocam, "sem dúvida nenhuma", o ideário que provocou essa transformação nos mercados - que sofrem, hoje, uma intervenção mínima dos órgãos reguladores - em questão. "Mas o desfecho disso vai ser determinado por um debate. E a minha expectativa é que esse debate seja muito intenso nos próximos meses, já que vai haver uma pressão muito grande para que a regulamentação seja mais restrita", acrescentou.

Belluzzo explicou que a economia atual foi moldada dessa forma por uma "coalizão de interesses", que teria juntado diversas frações empresas. Esse conjunto de forças foi impulsionado, segundo ele, pelo poder político dos Estados Unidos. "A política americana teve uma importância muito grande ao impor, por exemplo, a liberalização financeira, a liberalização das contas de capital de maneira generalizada nos anos 90, e propor uma articulação produtiva, comercial e financeira que parecia funcionar muito bem", disse.

Para ele, o crescimento contínuo da economia norte-americana ajudou a firmar a impressão de que tudo ia bem e que, então, ao invés de cuidar dos riscos a que a economia estava exposta, era possível aumentar a desregulamentação do mercado. "A evolução disso foi que levou à crise", disse.

Mas, da mesma forma que o modelo atual foi implementado pela força política, afirmou Belluzzo, só ela pode mudar a maneira como funciona o sistema financeiro hoje. "É preciso saber qual é a presença política que se opõe a essa maneira de funcionamento do sistema e a força que ele terá para promover essa transformação. Porque isso não vai ser uma coisa automática. Se você não tiver um arranjo de forças sociais que seja capaz de se opor à continuidade, provavelmente, depois de um curto período, tudo vai voltar a ser como era antes", alertou.

Pacote

Na hora de opinar sobre o pacote de resgate às instituições financeiras desenvolvido pelo governo norte-americano - que prevê recursos de US$ 700 bilhões para comprar ativos podres relacionados ao mercado de hipotecas -, eles são unânimes: o plano ajuda, mas não resolve a crise.

"A utilização de recursos públicos como a bala de prata que vai terminar com a crise. Será um passo importante para a redução da quase histeria que tomou conta de investidores e banqueiros e, com isto, abrir espaço para que o sistema financeiro possa voltar a cumprir sua função dentro de uma economia de mercado", disse Mendonça de Barros.

"Seguramente, os Bancos Centrais, o governo dos Estados Unidos, da União Européia, do Japão, terão que continuar monitorando, provendo liquidez e acompanhando a evolução dessa crise", completou Mercadante.

Para Belluzzo, o plano vai "simplesmente botar um piso para esse derretimento de preços". "Mas a questão central hoje é a contração do crédito", afirmou. "A questão hoje é como é que se desobstrui o crédito, como se recompõe o sistema de forma que as empresas e os consumidores possam ter acesso ao crédito e tenham disposição para gastar. O grave agora é essa paralisia, esse estancamento do crédito nas economias centrais."

Entenda a crise financeira que atinge a economia dos EUA.

 

20/09/2008 - 14h04
Entenda a crise financeira que atinge a economia dos EUA.
da Folha Online.
A crise no mercado hipotecário dos EUA é uma decorrência da crise imobiliária pela qual passa o país, e deu origem, por sua vez, a uma crise mais ampla, no mercado de crédito de modo geral. O principal segmento afetado, que deu origem ao atual estado de coisas, foi o de hipotecas chamadas de "subprime", que embutem um risco maior de inadimplência.
O mercado imobiliário americano passou por uma fase de expansão acelerada logo depois da crise das empresas "pontocom", em 2001. Os juros do Federal Reserve (Fed, o BC americano) vieram caindo para que a economia se recuperasse, e o setor imobiliário se aproveitou desse momento de juros baixos. A demanda por imóveis cresceu, devido às taxas baixas de juros nos financiamentos imobiliários e nas hipotecas. Em 2003, por exemplo, os juros do Fed chegaram a cair para 1% ao ano.
Em 2005, o "boom" no mercado imobiliário já estava avançado; comprar uma casa (ou mais de uma) tornou-se um bom negócio, na expectativa de que a valorização dos imóveis fizesse da nova compra um investimento. Também cresceu a procura por novas hipotecas, a fim de usar o dinheiro do financiamento para quitar dívidas e, também, gastar (mais).
As empresas financeiras especializadas no mercado imobiliário, para aproveitar o bom momento do mercado, passaram a atender o segmento "subprime". O cliente "subprime" é um cliente de renda muito baixa, por vezes com histórico de inadimplência e com dificuldade de comprovar renda. Esse empréstimo tem, assim, uma qualidade mais baixa --ou seja, cujo risco de não ser pago é maior, mas oferece uma taxa de retorno mais alta, a fim de compensar esse risco.
Em busca de rendimentos maiores, gestores de fundos e bancos compram esses títulos "subprime" das instituições que fizeram o primeiro empréstimo e permitem que uma nova quantia em dinheiro seja emprestada, antes mesmo do primeiro empréstimo ser pago. Também interessado em lucrar, um segundo gestor pode comprar o título adquirido pelo primeiro, e assim por diante, gerando uma cadeia de venda de títulos.
Porém, se a ponta (o tomador) não consegue pagar sua dívida inicial, ele dá início a um ciclo de não-recebimento por parte dos compradores dos títulos. O resultado: todo o mercado passa a ter medo de emprestar e comprar os "subprime", o que termina por gerar uma crise de liquidez (retração de crédito).
Após atingir um pico em 2006, os preços dos imóveis, no entanto, passaram a cair: os juros do Fed, que vinham subindo desde 2004, encareceram o crédito e afastaram compradores; com isso, a oferta começa a superar a demanda e desde então o que se viu foi uma espiral descendente no valor dos imóveis.
Com os juros altos, o que se temia veio a acontecer: a inadimplência aumentou e o temor de novos calotes fez o crédito sofrer uma desaceleração expressiva no país como um todo, desaquecendo a maior economia do planeta --com menos liquidez (dinheiro disponível), menos se compra, menos as empresas lucram e menos pessoas são contratadas.
No mundo da globalização financeira, créditos gerados nos EUA podem ser convertidos em ativos que vão render juros para investidores na Europa e outras partes do mundo, por isso o pessimismo influencia os mercados globais.
Foi esse o efeito visto em setembro do ano passado, quando o BNP Paribas Investment Partners --divisão do banco francês BNP Paribas-- congelou cerca de 2 bilhões de euros dos fundos Parvest Dynamic ABS, o BNP Paribas ABS Euribor e o BNP Paribas ABS Eonia, citando preocupações sobre o setor de crédito "subprime" (de maior risco) nos EUA. Segundo o banco, os três fundos tiveram suas negociações suspensas por não ser possível avaliá-los com precisão, devido aos problemas no mercado "subprime" americano.
Depois dessa medida, o mercado imobiliário passou a reagir em pânico e algumas das principais empresas de financiamento imobiliário passaram a sofrer os efeitos da retração; a American Home Mortgage (AHM), uma das 10 maiores empresa do setor de crédito imobiliário e hipotecas dos EUA, pediu concordata. Outra das principais empresas do setor, a Countrywide Financial, registrou prejuízos decorrentes da crise e foi comprada pelo Bank of America.

Bancos


Bancos como Citigroup, UBS e Bear Stearns tiveram prejuízos bilionários decorrentes da crise. Na semana que passou, uma nova onda de abalos afetou Wall Street.
O banco de investimentos Lehman Brothers não recebeu ajuda do governo, como a que foi destinada às duas maiores empresas hipotecárias americanas, a Fannie Mae e a Freddie Mac --que no dia 7 deste mês receberam a promessa de uma ajuda de até US$ 200 bilhões do Departamento do Tesouro.
As duas hipótecárias possuem quase a metade dos US$ 12 trilhões em empréstimos para a habitação nos EUA; no segundo trimestre, registraram prejuízos de US$ 2,3 bilhões (Fannie Mae) e de US$ 821 milhões (Freddie Mac).
Já o Lehman vinha procurando uma fonte de crédito para poder honrar seus compromissos, mas não teve sucesso. O banco chegou a procurar outras instituições interessadas em adquirir uma participação e o KDB (Banco de Desenvolvimento da Coréia do Sul, na sigla em inglês) até se interessou em negociar a princípio, mas a negociação terminou sem acordo. Sem alternativa, o banco entregou à Corte de Falências do Distrito Sul de Nova York um pedido de concordata.
O Merrill Lynch foi vendido ao Bank of America para não ter o mesmo destino. A seguradora americana AIG foi outra que quase quebrou, mas foi salva por um empréstimo de US$ 85 bilhões do Fed, em troca do controle da empresa. Acionistas da AIG, no entanto, tentam evitar transferir o controle.

Combate


O governo agiu no início do ano com a aprovação de um pacote de de US$ 168 bilhões de estímulo, que incluiu o envio de cheques de restituição de impostos a milhões de norte-americanos. O temor era de que o país pudesse cair em recessão.
Desde então, a ajuda do governo se tornou mais freqüente. Em março deste ano, o banco Bear Stearnms, também afetado pelas perdas com papéis ligados a hipotecas de risco, teve de ser vendido, e o Fed ajudou a financiar a operação de compra efetuada pelo JP Morgan.
Nesta semana, seis dos principais bancos centrais do mundo também tomaram a iniciativa de se juntar para oferecer liquidez ao sistema financeiro e evitar que os mercados de crédito ficassem paralisados.
O passo mais recente na série de medidas do governo dos EUA foi um pacote de até US$ 700 bilhões do governo, para comprar títulos hipotecários de risco, enxugando esses papéis de risco do mercado. A decisão de elaborar o pacote foi decidida na quinta-feira (18). O presidente Bush se manifestou a favor da medida: "É um pacote grande porque se trata de um problema grande", afirmou.